domingo, 29 de maio de 2011

Uma revolução?

"Se não nos deixam sonhar, não os deixaremos dormir"

Sim, qual o sonho que restou nos últimos anos?

O deus-mercado nos oferece dinheiro, status, carros potentes, Ipad´s.

Mas, agora percebemos que nada disso nos basta.

Queremos o sonho - a possibilidade de buscar algo maior que está além do que nem memso sabemos.

Não precisamos de certezas.

Não precisamos de caminhos pavimentados.

Queremos a chance de errar, porque não?

Queremos recomeçar o dia.

E viver; viver muito.

Por que a vida é sonho, escreveu um antigo poeta.

Se não há sonho, não há do que viver.



terça-feira, 3 de maio de 2011

Entre verdades e mentiras





Cada guerra é precedida por uma mentira dos meios de comunicação de massa. Hoje Bush ameaça a Venezuela e o Equador. Amanhã será o Irã? E depois, quem mais?

(...) Recordemos simplesmente quantas vezes os mesmos Estados Unidos e os mesmos meios já nos manipularam.

Cada grande guerra se “justifica” pelo que mais tarde (demasiado tarde) aparecerá como uma simples desinformação. Um rápido inventário:

1) Vietnã (1964-1975)
Mentira midiática: Nos dias 2 e 3 de agosto o Vietnã do Norte teria atacado dois barcos dos Estados Unidos na baía de Tonkin.
O que se saberá mais tarde: Esse ataque não aconteceu. Foi uma invenção da Casa Branca.
Verdadeiro objetivo: Impedir a independência de Vietnã e manter o domínio dos Estados Unidos na região
Conseqüências: Milhões de vítimas, malformações genéticas (agente laranja), enormes problemas sociais.

2) Granada (1983)
Mentira midiática:: A pequena ilha do Caribe foi acusada de que nela se construía uma base militar soviética e de trazer perigo à vida de médicos americanos.
O que se saberá mais tarde: Absolutamente falso. O Presidente Reagan inventou esses pretextos.
Verdadeiro objetivo: Impedir as reformas sociais e democráticas do premiê Bishop (depois assassinado)
Conseqüências: Brutal repressão e restabelecimento da tutela de Washington.

3) Panamá (1989)
Mentira midiática: A invasão tinha o objetivo de prender o presidente Noriega por tráfico de drogas.
O que se saberá mais tarde: Formado pela CIA o presidente Noriega reclamava a soberania ao fim do acordo do canal, o que era intolerável para os Estados Unidos.
Verdadeiro objetivo: Manter o controle dos Estados Unidos sobre essa estratégica via de comunicação.
Conseqüências: Os bombardeios dos Estados Unidos mataram entre 2 e 4 mil civis, ignorados pelos meios.

4) Iraque (1991)
Mentira midiática: Os iraquianos teriam destruído parte da maternidade da cidade de Kuwait.
O que se saberá mais tarde: Invenção total da agência publicitária Hill e Knowlton, paga pelo emir de Kuwait.
Verdadeiro objetivo: Impedir que o Oriente Médio resista a Israel e se comporte com independência em relação aos Estados Unidos.
Conseqüências: Inumeráveis vítimas da guerra, depois um longo embargo, inclusive de medicamentos.

5) Somália (1993)
Mentira midiática: O senhor Kouchner aparece na cena como herói de uma intervenção humanitária.
O que se saberá mais tarde: Quatro sociedades americanas tinham comprado uma quarta parte do subsolo somali, rico em petróleo.
Verdadeiro objetivo: Controlar uma região militarmente estratégica.
Conseqüências: Não conseguindo controlar a região os Estados Unidos a manterão num prolongado caos.

6) Bósnia (1992-1995)
Mentira midiática: A empresa americana Ruder Finn e Bernard Kouchner divulga a existência de campos de extermínio sérvios.
O que se saberá mais tarde: Ruder Finn e Kouchner mentiram. Eram apenas campos de prisioneiros. O presidente muçulmano Izetbegovic o admitiu.
Verdadeiro objetivo: Quebrar uma Iugoslávia demasiado esquerdista, eliminar seu sistema social, submeter a zona às multinacionais, controlar o Danúbio e as estratégicas rotas dos Bálcãs.
Conseqüências: Quatro atrozes anos de guerra para todas as nacionalidades (muçulmanos, sérvios, croatas). Provocada por Berlin, prolongada por Washington.

7) Iugoslávia (1999)
Mentira midiática: Os sérvios cometem um genocídio contra os albaneses do Kosovo.
O que se saberá mais tarde: Pura e simples invenção da OTAN como o reconheceu Jaime Shea, seu porta-voz oficial.
Verdadeiro objetivo: Impor o domínio da OTAN nos Bálcãs e sua transformação em polícia do mundo. Instalar uma base militar americana no Kosovo.
Conseqüências: Duas mil vítimas dos bombardeios da OTAN. Limpeza étnica de Kosovo pelo UCK, protegido pela OTAN.

8) Afeganistão (2001)
Mentira midiática: Bush pretende vingar o 11 de setembro e capturar Bin Laden
O que se saberá mais tarde: Não existe nenhuma prova da existência dessa rede. Além disso, os talibãs tinham proposto extraditar Bin Laden.
Verdadeiro objetivo: Controlar militarmente o centro estratégico da Ásia, construir um oleoduto que permitisse controlar o abastecimento energético do sul da Ásia.
Conseqüências: Ocupação extremamente prolongada e grande aumento da produção e tráfico de ópio.

9) Iraque (2003)
Mentira midiática:: Saddam teria perigosas armas de destruição, afirmou Colin Powell nas Nações Unidas, mostrando provas.
O que se saberá mais tarde: A Casa Branca ordenou falsificar esses relatórios (assunto Libby) ou fabricá-los.
Verdadeiro objetivo: Controlar todo o petróleo e chantagear seus rivais; Europa, Japão, China…
Conseqüências: Iraque submerso na barbárie, as mulheres devolvidas à submissão e ao obscurantismo.

10) Venezuela – Equador (2008?)
Mentira midiática: Chávez apoiaria o terrorismo, importaria armas, seria um ditador (o pretexto definitivo parece não ter sido escolhido ainda).
Verdadeiro objetivo: As multinacionais querem seguir com o controle petroleiro e de outras riquezas de toda América Latina, temem a libertação social e democrática do continente.
Conseqüências: Washington empreende uma guerra global contra o continente: golpes de estado, sabotagens econômicas, chantagens, estabelecimento de bases militares próximas às riquezas naturais.

Fonte
http://blogdomello.blogspot.com/

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Pra parar um pouco



Tudo aquilo que alguém diz que é urgente, sempre é algo que alguem deixou de fazer em tempo hábil e quer que você faça em tempo recorde"

A verdade, por mim mesma



A verdade é aquela que te liberta de qualquer prisão, seja ela física, moral ou da consciência. A verdade não é única; ela é um conceito pelo qual lutamos por ser essencial à sobrevivência digna do ser humano. E onde está a verdade? Sinceramente, essa resposta não saberia oferecer a quem lerá este tópico, porque ela nunca está onde queremos que ela esteja. Não que a verdade se esconda... mas acredito que ela fica bem em frente, próxima de nossas mãos e consciências.

Somos gente



Li este artigo no Azenha.

Tem um pouco da minha história.

Artur Henrique: Pelo fim das humilhações nas perícias do INSS

por Artur Henrique*, do site da CUT

Muitos trabalhadores e trabalhadoras que vão ao INSS em busca de afastamento por doença ou acidente enfrentam humilhações e dificuldades causadas por má conduta de parte dos peritos médicos que lá prestam atendimento.

Podemos citar algumas dessas dificuldades e humilhações, entre as mais frequentes: suspensão dos benefícios antes mesmo que o trabalhador se recupere; o não reconhecimento da relação de causalidade de inúmeras doenças com o trabalho, em especial as LER-DORT e doenças mentais que hoje ocorrem em dimensões epidêmicas e são os principais motivos de afastamento do trabalho; o descompasso de tempo entre a cessação de benefício e a perícia para avaliar um pedido de prorrogação ou de reconsideração, o que deixa os trabalhadores por meses sem qualquer rendimento.

E, apesar de o próprio Ministério da Previdência Social ter decidido, recentemente, que os pacientes que procuram o INSS podem passar pela consulta com a presença de acompanhante, os peritos médicos tem se recusado a cumprir a norma. Inclusive como corporação, através de sua entidade nacional, os peritos pronunciaram-se contra essa medida do ministério.

Ou seja, algo que qualquer paciente espera – e consegue - quando vai ao médico, ser acompanhado por familiar ou amigo, não é possível se esse médico for perito do INSS.
Os peritos também têm se oposto a outra medida do Ministério, a de reconhecer a validade do laudo de médicos assistentes. Conjugada com a liberdade de o paciente passar pela consulta com um acompanhante, a possibilidade de um médico assistente tomar decisões amplia as chances de humanização no atendimento do INSS – humanização compreendida como justiça e dignidade no trato e como acerto no diagnóstico.

Assim, além do direito dos pacientes, o código de ética médica vai sendo desrespeitado pelos peritos. Certamente por isso é que a corporação se sentiu tão incomodada com outra decisão do Ministério da Previdência, a de que os postos do INSS devem deixar à disposição dos pacientes um exemplar do código de ética. O incômodo foi tal que distribuíram, em nota pública, críticas à medida.

Essas críticas aos médicos peritos se fazem ainda mais imperativas hoje, 28 de abril, Dia Mundial em Memória às Vítimas de Acidentes e Doenças do Trabalho. Pela mesma razão, a CUT e demais centrais sindicais brasileiras – CGTB, CTB, Força Sindical, NCST e UGT – lançarão uma campanha conjunta pela humanização das perícias médicas do INSS e pela observação do novo código de ética médica. Estes temas dizem respeito ao exercício dos direitos de trabalhadores contribuintes do Regime Geral de Previdência Social nas situações em que necessitam de afastamento do trabalho por motivo de doença ou acidente.

Trata-se de uma situação que, além do trabalhador contribuinte enquanto segurado e da seguradora – o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) – envolve os interesses de um terceiro elemento que são as empresas, cuja participação no sistema ocorre por meio do pagamento do seguro acidente de trabalho e do recolhimento e cotização das contribuições pagas à previdência social.

Em meio a esta relação, por natureza assimétrica e permeada de distintos interesses, cumpre às perícias médicas do INSS o papel de avaliar incapacidade laborativa para fins de concessão de benefícios previdenciários aos trabalhadores, isto é, avaliar restrições físicas e/ ou psíquicas advindas de acidentes e doenças que impeçam o trabalhador de desempenhar temporária ou definitivamente as suas funções no trabalho.

Este é o ponto nevrálgico, por colocar em jogo, de um lado, a garantia das condições de subsistência do trabalhador e de sua família, direito básico, essencial, assegurado constitucionalmente no sistema de seguridade social brasileiro, e, de outro lado, a responsabilidade pela proteção social e pela reparação dos danos causados à saúde e à vida pelo trabalho, equação que no caso dos contribuintes da Previdência Social envolve o Estado e os empregadores.

No entanto, além das injustiças já citadas, é sabido, ainda, que muitos peritos trabalham simultaneamente no INSS e como médicos do trabalho de empresas, situação que contraria o preceito ético de imparcialidade, além de favorecer um preconceito predominante há décadas no INSS, o de que o trabalhador é um fraudador que simula doenças para obter benefícios. É sob este tipo suspeição que milhares de homens e mulheres fragilizados por estar feridos ou adoecidos são avaliados pela perícia.

Por fim, vale dizer, ainda, que apesar do termo “acidente” evocar eventos fortuitos, casuais, imprevisíveis e de responsabilidade difusa, pode-se dizer, sem risco de errar, que praticamente todos os danos causados à saúde e à vida pelo trabalho são absolutamente evitáveis, posto que são decorrentes de escolhas técnicas e organizacionais previamente planejadas e controladas pelos empregadores. Assim, longe de serem fruto de atos inseguros ou negligência dos trabalhadores, os acidentes e doenças do trabalho denunciam uma lógica de organização da produção e do trabalho nocivas à saúde.

Trata-se de um grave problema social e de saúde pública que precisa urgentemente ser enfrentado. Para se ter uma idéia, só em 2009 os dados oficiais da Previdência Social indicam o registro de 723.452 acidentes e doenças do trabalho. Parte destes acidentes e doenças resultou no afastamento das atividades de 623.026 trabalhadores devido à incapacidade temporária, sendo 302.648 até 15 dias e 320.378 com tempo de afastamento superior a 15 dias. Deste total 13.047 trabalhadores ficaram permanentemente incapacitados, aposentado-se precocemente em plena idade produtiva, e 2.496 pessoas morreram por acidente de trabalho, o que corresponde a cerca de 1 morte a cada 3,5 horas, se considerada a jornada diária de 8 horas.

Considerando que este ano trabalhadores, empresários e governos estarão debatendo e construindo propostas de implantação do Trabalho Decente no País e que a responsabilidade social tem sido ultimamente o principal jargão das empresas, neste 28 de Abril – Dia Mundial em Memória às Vítimas de Acidentes e Doenças e Doenças do Trabalho, chamamos a atenção para este grave problema e conclamamos a sociedade em defesa da vida, da saúde e dos direitos sociais historicamente conquistados.

Artur Henrique é presidente da CUT

A queda anunciada do Império



Li agora e achei interessantíssima a matéria publicada pelo site Swissinfo com a jornalista de economia Myret Zaki. Ela apresenta uma visão que, aqui, é muito raro encontrar quem tenha coragem de sustentar. E que é indispensável para entender os movimentos da economia, porque os analista, em geral, continuam sustentando o discurso que a crise de 2008 demonstrou ser insustentável.

As evidências, porém, são muito forte e, por isso, vão começando a surgir as vozes que dizem, como na fábula, o que não se quer ver: o rei está nu.
Transcrevo alguns trechos da matéria e da entrevista de Zaki.

“A moeda americana se transformou na maior bolha especulativa da História e está condenada a uma forte queda. Os ataques contra o euro são apenas uma cortina de fumaça para esconder a falência da economia americana, defende a jornalista suíça Myret Zaki em seu último livro.

“A queda do dólar se prepara. É inevitável. O principal risco no mundo atualmente é uma crise da dívida pública americana. A maior economia mundial não passa de uma grande ilusão. Para produzir 14 trilhões de renda nacional (PIB), os Estados Unidos geraram uma dívida de mais de 50 trilhões que custa 4 trilhões de juros por ano.”
O tom está dado. Ao longo das 223 páginas de seu novo livro, a jornalista Myret Zaki faz uma acusação impiedosa contra o dólar e a economia americana, que considera “tecnicamente falida”.

A jornalista se tornou, nos últimos anos, uma das mais famosas escritoras de economia da Suíça. Em seus últimos livros, ela aborda a situação desastrosa do banco suíço UBS nos Estados Unidos e a guerra comercial no mercado da evasão fiscal. Na entrevista a seguir, Myret Zaki defende a tese de que o ataque contra o euro é para desviar a atenção sobre a gravidade do caso americano.

Swissinfo.ch: A Senhora diz que o crash da dívida americana e o fim do dólar como lastro internacional será o grande acontecimento do século XXI. Não seria um catastrofismo meio exagerado?
Myrette Zaki: Eu entendo que isso possa parecer alarmista, já que os sinais de uma crise tão violenta ainda não são tangíveis. No entanto, estou me baseando em critérios altamente racionais e factuais. Há cada vez mais autores americanos estimando que a deriva da política monetária dos Estados Unidos conduzirá inevitavelmente a tal cenário. É simplesmente impossível que aconteça o contrário.

Swissinfo.ch: No entanto, esta constatação não é, de forma alguma, compartilhada pela maioria dos economistas. Por quê?
MZ: É verdade. Existe uma espécie de conspiração do silêncio, pois há muitos interesses em jogo ligados ao dólar. A gigantesca indústria de asset management (investimento) e dos hedge funds (fundos especulativos) está baseada no dólar. Há também interesses políticos óbvios. Se o dólar não mantiver seu estatuto de moeda lastro, as agências de notações tirariam rapidamente a nota máxima da dívida americana. A partir daí começaria um ciclo vicioso que revelaria a realidade da economia americana. Estão tentando manter as aparências a todo custo, mesmo se o verniz não corresponde mais à realidade.

Swissinfo.ch: Não é a primeira vez que se anuncia o fim do dólar. O que mudou em 2011?
MZ: O fim do dólar é realmente anunciado desde os anos 70. Mas nunca tivemos tantos fatores reunidos para se prever o pior como agora. O montante da dívida dos EUA atingiu um recorde absoluto, o dólar nunca esteve tão baixo em relação ao franco suíço e as emissões de novas dívidas americanas são compradas principalmente pelo próprio banco central dos EUA.
Há também críticas sem precedentes de outros bancos centrais, que criam uma frente hostil à política monetária americana. O Japão, que é credor dos Estados Unidos em um trilhão de dólares, poderia reivindicar uma parte desta liquidez para sua reconstrução. E o regime dos petrodólares não é mais garantido pela Arábia Saudita.

Swissinfo.ch: Mais do que o fim do dólar, a Senhora anuncia a queda da superpotência econômica dos EUA. Mas os Estados Unidos não são grandes demais para falir?
MZ: Todo mundo tem interesse que os Estados Unidos continuem se mantendo e a mentira deve continuar por um tempo. Mas, não indefinidamente. Ninguém poderá salvar os americanos em última instância. São eles quem terão que arcar com o custo da falência. Um período muito longo de austeridade se anuncia. Ele já começou. Quarenta e cinco milhões de americanos perderam suas casas, 20% da população sairam do circuito econômico e não consomem mais, sem contar que um terço dos estados dos EUA estão praticamente falidos. Ninguém mais investe capital no país. Tudo depende exclusivamente da dívida (americana).

http://http://grupobeatrice.blogspot.com/

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Não sei quem escreveu, mas é lindo!



"De um lado, o pesadelo.

Uma madrugada sem dormir, a falta de luz, o alto barulho da chuva vencendo um silêncio de tensão compartilhada.

Ta chovendo demais, ta chovendo demais.

Pela janela a luz de relâmpagos revela a rua alagada, enquanto o estrondo e o chacoalhar de um carro que tentava escapar revelam o enorme buraco escondido pela água escura.

O dia amanhece, os olhos ainda exploram os estragos visíveis, quando o som indescritível de uma avalanche anuncia algo de grandioso acontecendo. O coração dispara, o olhar se volta para a esquerda, e a consciência duvida do que os olhos estão vendo. Todo o morro esta descendo.

É muita, muita terra.

O entulho some da vista, escondido pelos prédios. Um forte estrondo é ouvido, surge uma gigantesca nuvem de poeira. Não era encosta, não havia falhas na topografia nem tampouco casas em local de risco. É mata nativa, reserva natural. Se ali está desabando, então todo o resto já terá caído.

O pensamento se volta para os amigos que ali residem. Nomes, rostos. Corremos para o telefone. Mudo. Ainda chove forte, mas é preciso ir lá ver. Há lama e destruição por todos os lados, pessoas choram e correm. Na rua anterior um verdadeiro rio impede a passagem, permitindo apenas ver um caminhão dos bombeiros esmagado por entulhos. “Seis bombeiros morreram” – alguém diz, aos prantos. Não era boato. Mais alguns minutos e a chuva para. Podemos chegar mais perto.

Corpos passam em macas o tempo todo, bombeiros perguntam se alguém tem
experiência em primeiros socorros ou reanimação. É difícil saber qual a melhor forma de ajudar. Amigos de infância estão debaixo de uma montanha de lama e escombros, onde antes havia belas casas tradicionais. Uma grávida é resgatada enquanto dá à luz um filho morto. Do outro lado da praça, a água cobre carros e pontes, invade o shopping. Pessoas buscam lugares elevados, cachorros nadam a seus lados. Há pânico e informações desencontradas por todos os cantos. “A igreja de Santo Antônio está destruída”, “o teleférico acabou”, “edifício tal está para cair”, “fulano de tal morreu”, “estrada tal está interditada”, “tal bairro não existe mais”.

Uma volta pela cidade começa a dar a dimensão da tragédia, enquanto a luz não volta e não é possível ver os jornais. A coisa foi grande, foi muito grande. Devem estar tentando falar com a gente, querendo notícias. O drama extrapola os limites da zona atingida. Não há como tranqüilizar amigos ou parentes. Voltamos para casa. A comida na geladeira ameaça estragar. É preciso fechar o registro de água, para que a lama e o esgoto não contaminem o que resta na cisterna. É preciso economizar. Há pessoas presas em elevadores, e a luz não
voltará em menos de dois dias. A subestação foi afetada, postes caíram, e há fios de alta tensão entre os escombros, onde também há vazamento de gás. O comércio está fechado, hospitais estão isolados e/ou destruídos, não há gasolina. Amigos se reencontram e cumprimentam em silêncio. Não cabe perguntar se está tudo bem, é preciso buscar novas formas de saudação.

O sol se põe, é preciso tentar dormir. Mas como? Bateria do celular começa a acabar, na eterna busca por sinal. Lanternas e velas se esgotam apesar do racionamento. O mundo fica cada vez mais escuro, somos todos cegos. A noite se arrasta no medo de que volte a chover. Um banho rápido e gelado no escuro talvez ajude a passar o tempo e a diminuir um pouco a sensação de angústia e tensão.

O sol torna a nascer. Parentes de vítimas não se afastam dos montes de escombros. Passaram a noite por lá. Não existem ônibus circulando, pessoas caminham dias inteiros. O dinheiro é curto, bancos e caixas eletrônicos não funcionam. Filas se formam nos poucos estabelecimentos que se atrevem a funcionar. A entrada de pessoas é controlada, pois há medo de saques. Os preços se multiplicam, uma única vela pode custar até dez reais. Revolta e tristeza invadem a alma: “há necessidade disso? Já não sofremos o bastante?”.

A presidente está na nossa rua, os helicópteros não param. “A coisa deve ter sido ainda maior do que parece” – pensamos. Ainda sem luz, não temos tanta noção. A cidade se enche de bombeiros, policiais, homens do BOPE, da Guarda Nacional. O Exército também está aqui, é muita gente trabalhando. Na praça ergue-se um hospital de campanha; no Instituto de Educação um IML é improvisado. Um médico pede um pouco de pomada descongestionante, pois o cheiro dos corpos já em decomposição começa a se tornar insuportável, e se espalha por toda a cidade.

Uma grande caixa d’água se rompe num bairro afastado. A notícia ganha proporções catastróficas no boca-a-boca de uma população apavorada. Interfone e telefone tocam ao mesmo tempo. “Corre que a represa rompeu, vai inundar a cidade inteira, a água vai chegar até o segundo andar”. Bombeiros apavorados sobem em caminhões, doentes são transportados para os andares superiores de hospitais improvisados, pessoas são pisoteadas e atropeladas, ou brigam ferozmente por uma vaga nos caminhões que abandonam o centro à toda velocidade. Não haveria volume d’água na maior represa da cidade que fosse suficiente para causar nem um milésimo do que era alertado, mas pouca gente consegue pensar calmamente quando até mesmo os militares estão em pânico. Alarme falso, terror real.

De outro lado, a esperança.

Caminhões com donativos começam a chegar um após o outro, enquanto pessoas surgem de todas as cidades dispostas a ajudar. Os telefones começam a tocar timidamente, ainda é difícil conseguir contato. Do outro lado da linha vozes amigas choram de alívio a cada alô. Boas notícias surgem, de vez em quando. Existem sobreviventes, algumas pessoas são resgatadas com vida. Em Friburgo, no bairro de Duas Pedras, o morador da casa mais alta, próxima à Fundação Getúlio Vargas, sente a estrutura de sua casa balançar e sai de imediato. Desce a rua no escuro e debaixo de chuva dando o alarme do desabamento iminente aos seus vizinhos. O morro desaba, mas nenhuma vida se perde ali. Herói da vida real, prefere o anonimato.

O trabalho no voluntariado consola e renova. A sensação inigualável de servir e ser útil, a admiração por ver pessoas de fora trabalhando tanto ou mais que nós, os interessados. Descarregar um caminhão dá muito mais trabalho do que parece, descobrimos isso rapidamente. E imaginar que, em algum lugar do Brasil, este mesmo trabalho estafante foi feito com alegria por pessoas que nem sequer nos conhecem...

A ajuda material é, a um só tempo, útil e simbólica, pois carrega em si uma mensagem invisível. Sacia as necessidades do corpo, cura as doenças da alma. Uma garrafa d'água não é só uma garrafa d'água. É uma declaração de amor e de apoio, de alguém que saiu de casa e foi comprar, levou para o posto de coleta, onde pessoas com amor carregaram o caminhão. É, portanto, material sagrado. É sacrifício do povo, é atitude, é gente comendo menos para que outros possam comer alguma coisa. É carinho materializado.

Nos hemocentros, filas se formam com doadores. Doadores de sangue, doadores de vida. Gente que literalmente deseja dar parte de si mesmo ao próximo. Impossível se manter o mesmo diante de tantas forças, sejam elas tristes ou bonitas. De certo modo, é justo dizer que todos nós morremos debaixo do lamaçal. Não somos mais os mesmos, nem temos o direito de ser.

A consciência sobre as bênçãos e responsabilidades de simplesmente estar vivo se amplia indefinidamente. Continuamos aqui, por algum motivo. Estamos sendo abraçados, protegidos. É preciso justificar isso, é preciso trabalhar, honrar os que se foram, e os que estão ajudando. A vida nos deu uma página em branco. É preciso reconstruir, e fazer uma cidade melhor e mais segura do que antes. É preciso renascer, tornar-se uma pessoa melhor e menos alienada, abandonar o superficial e voltar os olhos ao essencial. É preciso ajudar a quem precisa, dividir o que se tem. Há que brotar vida verdadeira desta mesma lama, adubada por tantos amigos inesquecíveis que por lá pereceram.

A luz voltou, e os jornais falam em tragédia anunciada. Meia verdade. Em Petrópolis e Teresópolis choveram 130 mm. Em Friburgo foram 182. Em algumas cidades a tragédia de fato se concentrou em bairros periféricos e casas em locais de maior risco. Em Friburgo, reservas naturais e mansões desabaram da mesma forma. Casas de classe média alta, a 200 metros de encostas, foram soterradas. Não houve distinção. Falar em drenagem ou muros de contenção diante de tamanha potência é fazer piada de mau gosto. Útil, sim, seria um plano diretor livre de demagogias, e um sistema de alarme eficiente, como o herói anônimo de Duas Pedras.

Chega o domingo, e com ele os primeiros raios de sol. Faz um dia bonito, apesar da poeira, e quando começa a anoitecer o céu assume uma coloração azul deslumbrante. Uma leve brisa sopra pelas ruas desertas, e, por um instante, as sirenes dão uma trégua. Fecho os olhos por alguns segundos. Torno a abri-los. Perco o olhar nas estrelas e me deixo levar. Em minha cabeça ouço nitidamente a voz vigorosa de Renato Russo cantando.

“Mas é claro que o sol vai voltar amanhã...” "
Minha homenagem e respeito a todos as pessoas, árvores e animais que tombaram e sofreram com as chuvas na Região Serrana do Rio de Janeiro em janeiro de 2011.