
No dia 22 de abril de 2009 um homem se apresentou diante um Tribunal. Fato corriqueiro, pois desde que o ser humano se organiza em tribos, grupos, sociedades, países nós nos entrejulgamos e estabelecemos os parâmetros do que é socialmente aceitável.
Evoluímos bastante: já não oferecemos nossos inimigos aos deuses nem às fogueiras da inquisição, entretanto, em nosso inconsciente sobrevive este instinto animalesco de matar.
Mas não se elimina a vida física do ser humano: se mata sua honra, sua dignidade.
Escrevo estas palavras em homenagem ao homem que foi ao tribunal no dia 22/4: Protógenes Queiroz.
Como escreveu o jornalista Vitor Hugo Soares:
Declamou o delegado Protógenes (poesia de Eduardo Alves Costa):
Querem meu verso de nariz para o ar, equilibrando a esfera,
enquanto alguém bate com a varinha para me por no compasso.
Pedem-me que não seja violento
e me mantenha equilibrado entre a forma e o fundo,
porque a platéia não deve sofrer emoções fortes...
Mas eu, nascido num tempo de sussurros,
tenho a voz contundente e por mais que me esforce
não sirvo para cantar no coro "...
Sei apenas tocar atabaques.
Assim, me perdoem os amantes e os arquitetos dos labirintos.
Que as senhoras se protejam com o xale e os corações delicados
se encostem na parede para fugir às correntes de ar
Bato no atabaque até estourar os tímpanos fracos
e chamo num grito de gozo as almas bravas para dançarmos juntos, mordidos pelas mentiras do mundo
com os nervos envenenados e a jugular aos pinotes"...
O condutor da Operação Satiagraha delimitou aí os campos em que se travaria a seguir o embate da Quarta-Feira Santa. Ah, o depoente não deixou passar em branco o registro emblemático da Paixão e da Páscoa logo de saída. Frisou exemplos de perseguições bíblicas, tentativas de transformar em criminoso e réu, quem tenta mostrar caminhos, ou apuram descaminhos no campo do interesse público - e denunciam a falta de ética e a corrupção das empresas, da política, dos governos.
"Hoje o povo enxerga tudo, não existem mais burros no Brasil, como muitos ainda imaginam", avisou Protógenes.
Em seis horas do interrogatório da CPI, Protógenes seguiu à risca os versos do poeta fluminense. Não permitiu, em nenhum momento, que - a começar pelo nada isento presidente da comissão, deputado Marcelo Itagiba, e seu sempre oscilante braço direito, o baiano Nelson Perllegrino (relator), que batiam mais insistentemente com a varinha dos amestradores -, o fizessem equilibrar a bolinha com o nariz levantado, como os bem treinados animais de circo.
Não cedeu nem às irônicas e, em geral egocêntricas, provocações do deputado Raul Jungmann (PPS-PE) - escolada raposa política mal disfarçada pela rala penugem de tucano -, que cobrava com insistência que o depoente desse os "nomes aos bois e às manadas, como prometido". Mas não se diga, por injusto, que o delegado não deu informações relevantes na última quarta-feira.
A começar por uma das mais quentes pautas jornalísticas do dia, quando comunicou que, enquanto ele dava o seu depoimento em Brasília, colegas seus da PF o avisavam de que no Rio de Janeiro ocorria uma batida nas empresas do banqueiro Daniel Dantas, em cumprimento a mandado de busca e apreensão, "para obter os livros fiscais de registro obrigatório da contabilidade do Grupo Opportunity".
Ofereceu também preciosos detalhes do "Projeto Guarda-Chuva", elaborado em 1992, com a participação e a assinatura, segundo Protógenes, do hoje ministro Especial para Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger, na época advogado de Dantas. O acordo previa a utilização do dinheiro dos fundos de pensão no programa do governo brasileiro de privatizações, principalmente em negócios relacionados com recursos nacionais. Entre estes, a Transposição das águas do Rio São Francisco.
Como se vê, fatos e nomes não faltam para quem deseja, de fato, buscar a verdade.
Fonte:http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI3696322-EI13528,00-Protogenes+o+tocador+de+atabaque.html